9 de agosto de 2022

3.2.1 Personagens principais

 

3.2.1  Personagens principais

 

Como o perfil dos alunos do cesube parece compor uma situação ímpar — a quase-metade dos estudantes matriculados no curso de Educação Artística/Artes Visuais atuar no magistério —, esta investigação focou as concepções e práticas de estudantes-professores/as sobre a Proposta Triangular para o ensino de arte. Os sujeitos da pesquisa são quatro estudantes da licenciatura em Educação Artística/Artes Visuais do cesube, matriculados em diferentes turmas e selecionados porque atuam na docência de Arte. Dentre eles, uma estudante-professora tem outra formação universitária: licenciatura em História. Todos os entrevistados têm idade superior a 32 anos e experiência com o ensino de arte de, no mínimo, 24 meses — embora o tempo de atuação no magistério oscile entre 7 e 25 anos. Como critério de seleção dos sujeitos da pesquisa, considerei os níveis de ensino: selecionei uma estudante que atua na educação infantil — Tininha; outra, no ensino fundamental — Raquel; um que leciona no ensino médio — Mizac; outra que trabalha no ensino não formal[1] — Clésia.[2]

As entrevistas foram feitas conforme roteiro (apêndice a) formulado previamente, que orientou o diálogo. Após a primeira entrevista, eu o reavaliei e fiz modificações para adequá-lo mais aos objetivos da pesquisa (cf. apêndice b). As perguntas foram elaboradas segundo a dinâmica da conversa e de modo a dar liberdade para falarem, por isso diferem um pouco de entrevistado/a para entrevistado/a. A maioria das entrevistas ocorreu nas residências dos/as entrevistados/as. Embora eu os/as encontre quase todo dia em corredores ou salas de aula da faculdade, pensei que no ambiente extra-acadêmico poderiam se expor com mais naturalidade. Essa escolha se mostrou importante. Senti que os/as entrevistados/as ficaram à vontade nas entrevistas: não houve constrangimento por causa do gravador e sempre procuravam, em meio à resposta, apresentar fotografias de seu trabalho.

O primeiro entrevistado foi Mizac. Ansioso no primeiro encontro, na segunda entrevista me convidou para irmos ao barzinho da esquina, onde conversamos maisinformalmentesobre seu trabalho em sala de aula; talvez para se sentir mais seguro, ele tenha levado seu caderno de anotações — segundo ele, seudiário de aulas”. A seguir, entrevistei Raquel, que me recebeu em sua residência com chá e biscoitos à mesa; e então Tininha, que me recebeu com uma mesa cheia de fotografia. Aliás, fotografias ilustraram, também, a entrevista seguinte, com Clésia: ela trouxe duas pastas cheias delas e de relatórios diários que registram seu trabalho.

A princípio, investiguei o motivo para buscarem a formação universitária na licenciatura em Artes Visuais, pois atuavam como profissionais. Preocupei-me em saber se tiveram contato com a Proposta Triangular antes de ingressarem no curso de graduação e que conhecimentos tinham dela; e também conhecer suas concepções sobre a Proposta Triangular, como a praticavam. Essa entrevista destacou a leitura de imagens no ensino de arte: procurei saber se levavam imagens para a sala de aula, que tipo e como trabalhavam com elas. Pelas entrevistas, pude conhecer mais o universo cultural dos estudantes-professores/as, quais eram suas escolhas curriculares e como as justificavam. Nas entrevistas, todos se preocuparam em me mostrar fotografias do processo de trabalho desenvolvido ou da produção dos alunos resultante de projetos afins a esse processo.

Dentre os/as estudantes-professores/as do grupo selecionado, Raquel é a mais velha (45 anos) e tem a maior experiência de atuação no magistério: 25 anos; trabalha como professora de artetrês; ainda coordena cursos de “educação em valores humanos[3] e dá assessoria educacional numa creche de Campinas (sp). Solteira, nas entrevistas comentou que muitojornais, revistas e livros —, assiste à tevê esporadicamente e gosta de freqüentar espetáculos de teatro e shows:

Vou a espetáculos de teatro, sempre que a agenda cultural da cidade traz boas peças. A última a que assisti foi com a Irene Ravache. A expressão verbal com a corporal foi de uma harmonia ímpar. Assisto a shows quando vou a São Paulo, no mínimo duas vezes por ano.

Raquel afirma, ainda, que procura estar atualizada quanto à produção cultural; frisa que sua educação artística começou em casa, com os pais: “Muita música saindo do violão e da voz de meu pai e muita pintura, artesanato e bordados saindo das mãos da mamãe”.

Tininha tem 41 anos; do grupo aqui considerado, é a mais nova no curso de Educação Artística/Artes Visuais: está na segunda série. Também solteira, mora com os pais, em Uberaba, há sete anos. Fez magistério na capital paulista, onde morou. Mostrou ser uma pessoa dinâmica: na entrevista, disse que todo tipo de literatura; disse, ainda, que assiste a muitos filmes em dvd (cerca de dez por semana) e vai a São Paulo, ao menos, cinco vezes ao anoquando freqüenta exposições de arte. Leciona na educação infantil e no ensino fundamental; e atuou em várias áreas das linguagens artísticas: artes plásticas, artesanato, dança, música (toca flauta) e teatro; também escreve poemas. Comenta que doa sua pintura ou seu artesanato a diversas pessoas: “Minha produção artística nunca fica comigo”. Quando morou em São Paulo, estudou dança numa academia que privilegiava danças folclóricas russas. Diz ela: “ fiz muitas coisas das quais gostava. Dança eu adorei; foi minha paixão. Eu fiz folclore russo na academia e, por isso, não fiz faculdade em São Paulo. Decidi-me pela dança”.

Clésia é casada, tem 35 anos de idade e duas filhas. Morou numa pequena cidade vizinha a Uberaba, na zona rural, até os 18. Com experiência de 12 anos como professora, é educadora do Centro Municipal de Educação Avançada (cemea), espaço alternativo para crianças e adolescentes mantido pela prefeitura. Como tinha habilidades artísticas e afinidades com artes, conseguiu ser contratada para executar atividades educacionais artísticas no ensino informal, mesmo sem habilitação em artes. Afirma que pouco — “tem que ter tempo para ler” — e o que é direcionado: notícias culturais, de arte ou auto-ajuda. Não costuma ir ao cinema, mas foi a espetáculos de teatro ou dança quando eram atividades da licenciatura. Disse que costuma ir com freqüência a exposições de artes plásticas na cidade: “Vou toda semana. Ontem mesmo fui na exposição do Cleófas”. Na entrevista, afirmou conhecer a produção de artistas nacionais e estrangeiros e que se identifica com obras de Picasso, artes pré-colombianas, africanas e indígenas. Sobre sua produção artística, relatou:

Faço de tudo um pouco. Gosto muito de desenho. Mas eu comecei minha produção artística mesmo foi em 1998, com o cimento, que aprendi no curso do cefor. Também sou associada à Casa do Artesão. Sabe que já vendi sete trabalhos meus?

Mizac tem 34 anos, é solteiro e dá aulas de artedois anos, no ensino regular. ministrou oficinas de arte antes de atuar na educação formal e produz peças artísticas. Em seus trabalhos, ele diz que explora a irreverência e que se identifica com a arte do francês Marcel Duchamp. Sua produção lhe rendeu convites de secretarias de Educação e associações de artesãos para ministrar oficinas. Foi assim que iniciou sua prática educativa. Afirmou ter trabalhado por seis anos com escultura em pedra-sabão e outros tipos, bem como ter exposto várias vezesesculturas, fotografias e outros de seus trabalhos — na Fundação Cultural de Uberaba e em pequenas galerias de Uberaba e Peirópolis. Participa de cursos oferecidos pela fundação cultural, é membro do Conselho Municipal de Políticas Culturais, no qual representa a área de arte e educação.



[1] Diferentes formas de ensino são classificadas na literatura como: educação formal, educação não formal e educação informal. “A educação formal pode ser resumida como aquela que está presente no ensino escolar institucionalizado, cronologicamente gradual e hierarquicamente estruturado, e a informal como aquela na qual qualquer pessoa adquire e acumula conhecimentos, através de experiência diária em casa, no trabalho e no lazer. A educação não-formal, porém, define-se como qualquer tentativa educacional organizada e sistemática que, normalmente, se realiza fora dos quadros do sistema formal de ensino.” (bianconi; caruso, 2005, p. 20).

[2] Emprego nomes verdadeiros nesta pesquisa porque fui autorizada a fazê-lo.

[3] Os cursos são realizados na fundação Peirópolis, no distrito de Peirópolis, a 20 quilômetros de Uberaba (mg), e têm proposta educativa baseada em cinco valores universais: amor, paz, verdade, ação correta e não-violência.

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