2.4 Eixos de aprendizagem da arte
na Proposta Triangular
A Proposta
Triangular se sustenta
em três
eixos: “[...] o fazer,
a leitura e a contextualização” (barbosa, 1998, p. 37). Essa autora define cada
eixo e diz como
foram interpretados, referindo-se a eles
como ações
integradoras dos componentes
curriculares. Segundo ela, na Proposta
Triangular, o eixo
fazer artístico
é prática artística
expressa no trabalho
de ateliê, prática
que enfatiza a percepção,
a fantasia e a imaginação
criadora do aluno para
possibilitar o desenvolvimento
de um processo
próprio de criação.
Em geral,
o fazer artístico
não deve se basear
na simples imitação
de modelos propostos, mas no desenvolvimento
da criatividade do educando,
a ser expressa
nas mais diversas linguagens
artísticas. Sobre
a importância desse fazer
para o ensino
e a aprendizagem, Barbosa diz que:
[...] é insubstituível para a aprendizagem da arte e para o
desenvolvimento do pensamento/linguagem presentacional, uma forma diferente do
pensamento/linguagem discursivo, que caracteriza as áreas nas quais domina o
discurso verbal, e também diferentemente do pensamento científico presidido
pela lógica. (barbosa, 1996, p. 34).
Ao conceber o fazer como
fundamental ao desenvolvimento do pensamento e da linguagem artísticos, Barbosa
o entende como resultado de interpretação e representação pessoal interligadas
à leitura e contextualização da obra de arte. Espera-se que — diz a autora
— os estudantes vivenciem intensamente o processo de criação, desenvolvendo-se
tanto nos modos de fazer técnico quanto na representação imaginativa e da
expressividade. Ao mesmo tempo, o ensino de arte só pode ser consistente se o
fazer artístico (pessoal e coletivo) se relacionar com as produções artísticas,
estimulando a aprendizagem da história da arte e da leitura de imagens.
Em A
imagem no ensino
da arte, Barbosa exemplifica o fazer
artístico ao apresentar o trabalho desenvolvido com crianças e adolescentes em
visita ao mac. Descreve com detalhes a
“prática triangular” e
ilustra o fazer artístico
com releituras dos visitantes sobre as obras antes analisadas. As releituras foram feitas no trabalho de ateliê. Barbosa argumenta
que o fazer artístico ajuda
a desenvolver o pensamento
visual, mas
não basta
“[...] para a leitura
e o julgamento de qualidade
de imagens produzidas por artistas ou do mundo cotidiano que nos cerca” (barbosa 1996, p. 34). Como o ensino da arte na escola objetiva
formar não artistas, mas conhecedores e apreciadores
da obra de arte,
a autora diz ser necessário
possibilitar aos estudantes
o acesso às diferentes
formas artísticas.
O segundo eixo da
Proposta Triangular
é a leitura da imagem.
Já na primeira
publicação sobre a proposta,
Barbosa argumenta que
o eixo deve ser
desenvolvido por
exercícios de leitura:
“a metodologia usada para
leitura de obra
de arte varia de acordo
com o conhecimento
anterior do professor,
podendo ser estética,
semiológica, iconológica, princípios da gestalt
etc.” (barbosa, 1996, p. 19). Ela
justifica sua importância
para o ensino
da arte:
Temos que alfabetizar para a leitura da imagem. Através da leitura das
obras de artes plásticas estaremos preparando a criança para a decodificação da
gramática visual, da imagem fixa e, através da leitura do cinema e da
televisão, a prepararemos para aprender a gramática da imagem em movimento. (barbosa, 1996, p. 34).
A
Proposta Triangular pretende que a leitura de imagens se oriente pela busca e
descoberta; que seja meio de despertar a crítica no aluno e lhe possibilitar
emitir juízos de valor. Em
autores que estudam a leitura de imagens, tais como Manguel (2001), Buoro (2002), Pillar (2003) e Rossi (2003), nota-se que o objetivo desta é preparar o educando para
compreender uma gramática visual aplicável a qualquer imagem, artística ou não,
em qualquer lugar, seja na aula de arte, seja no cotidiano do aluno.
A leitura da imagem, nesta proposta de ensino da arte, desenvolve as
habilidades de ver, julgar e interpretar as qualidades das obras, compreendendo
os elementos e as relações estabelecidas no todo do trabalho. [...] Ler uma
imagem é saboreá-la em seus diversos significados, criando distintas
interpretações, prazerosamente. (pillar; vieira, 1992, p. 9).
No
processo de leitura, a obra de arte adquire conteúdo expressivo para o
educando, por isso é mestra para o desenvolvimento da percepção estética.
Quando se lê uma obra — diga-se, quando se reconhecem sentidos nela —, entram
em ação conhecimentos artísticos e não artísticos. A leitura ocorre no diálogo
do expectador com a obra, num tempo/espaço preciso. Por isso, “[...] não há uma
leitura, mas leituras, onde cada um precisa encontrar modos múltiplos de melhor
saborear a imagem” (pillar,
1999, p. 20).
Enquanto
o pcn/Arte
emprega a expressão “apreciação significativa” para se referir a ações como
convivência com produções artísticas, análise de formas visuais, contato
sensível, reconhecimento de técnicas e experimentação de leitura das formas
visuais em diversos meios de comunicação da imagem (brasil, 1997), Barbosa prefere usar
leitura de imagem ou da obra de arte. Ela entende que a expressão “apreciação
artística” — predominante nos anos de 1970 —
pode ser tomada só em sentido estrito: admiração, fruição prazerosa da obra de
arte (barbosa, 1996).
Diz ela:
Os pcn
preferiram designar a decodificação da obra de arte como apreciação. Costumo usar
a expressão “leitura”
da obra de Arte
em lugar
de apreciação, por temer
que o termo
apreciação seja interpretado como um mero
deslumbramento, que vai do arrepio ao suspiro
romântico. A palavra leitura sugere uma interpretação
para a qual
colaboram uma gramática, uma sintaxe,
um campo
de sentido decodificável, a
decodificação do mundo e a poética pessoal
do decodificador. (barbosa, 2002b, s. p.).
Sobre a variedade
de conceitos de semântica
quase idêntica
para se fazer referência à análise
da arte e de imagens,
Rossi explica: a palavra leitura pode ser confundida
com acesso,
apreciação, apreensão, atribuição de sentido,
compreensão, recepção,
pois todas denotam o processo
vivido pelo expectador no diálogo
com a obra/imagem — “[...] na interatividade, na pintura, no museu
ou na sala
de aula, onde,
atualmente, milhares
de alunos estão a olhar
para as reproduções
de obras de arte
que os professores
estão trazendo para as atividades
de leitura” (rossi, 2003, p. 19).
Como obra de arte nenhuma
pode ser apreciada ou avaliada em si mesma, separada do contexto
histórico-cultural em que foi produzida, o terceiro eixo da Proposta Triangular
para o ensino de arte propõe a contextualização, atividade que vai além das
informações meramente factuais e de uma visão histórica cronológica.
A História da Arte e da Cultura deve ser algo vivo e ágil, onde o
importante não é um estudo cronológico, mas uma perspectiva inter-relacionada
com as produções artísticas, com os conceitos estéticos das diferentes épocas e
com o próprio meio social em que determinada expressão artística se dá. (osinski, 2002, p. 110).
Na Proposta Triangular, a
contextualização requer conceber a história da arte como processo contínuo, orgânico
e dialético, que enfoca, em dado momento histórico,
o registro do sentimento
estético e da visão
do artista ante
os acontecimentos que
o envolveram no momento de sua criação. Ao
conhecer a história
da arte, o aluno
poderá estabelecer relações
mais profundas com
sua própria
produção artística,
possibilitando-lhe intervir e reinventar
sua obra.
O aluno pode se relacionar
com a arte de
diversas épocas e estilos,
conhecer os diferentes
elementos que
entraram em sua
composição e construir
um conhecimento
teórico-prático. “A história da arte ajuda as crianças a entender algo do lugar e
tempo nos
quais as obras
de arte são
situadas. Nenhuma forma de arte
existe no vácuo: parte
do significado de qualquer
obra depende do entendimento
de seu contexto.”
(barbosa, 1996,
p. 37). Posto que
“[...] o conhecimento em arte se dá na intercessão da experimentação, da decodificação e da informação” (barbosa, 1996), na Proposta
Triangular importa, então,
desenvolver a capacidade
de formular hipóteses,
julgar, justificar e contextualizar julgamentos
sobre imagens
artísticas.
A
Proposta Triangular[4]
resgata a criação contida nas etapas do fazer e do ler obras de arte ampliadas através
da compreensão histórica.
No dizer de Barbosa (2002b), o foco na contextualização é central
na educação contemporânea,
seja ela baseada
em Freire, Vygotski, Apple ou genericamente construtivista. Se não se exercita a contextualização, corre-se o risco de que,
do ponto de vista
da arte, a pluralidade
cultural se restrinja a uma abordagem aditiva. Embora
a história da arte
seja um componente
da aprendizagem da arte, Barbosa refere-se a este eixo sempre como
contextualização, porque esta pode ser não só histórica, mas também
antropológica, biológica, ecológica, geográfica, psicológica
e social. Noutros termos,
associa-se o pensamento a um vasto conjunto de saberes,
disciplinares ou
não (barbosa, 1998).